quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

Frase do Ano



"THERE IS A CRACK IN EVERYTHING;

THAT'S HOW THE LIGHT GETS IN"


LEONARD COHEN


Photo by Maysa de Albuquerque


domingo, 14 de dezembro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": O Aposento Inconsútil


"Você continua escrevendo porque
o que mais você pode fazer?"
MARGARET ATWOOD



- à nossa volta, jaz
o silêncio

- avesso a metáforas, porque
pleno

- sem saber, também
saberemos?


Words by Lívia Soares
Photo by Loretta Lux


Da Série "Glimpses of Nirvana": BEAUTY MARK (2008)

Charlotte Gainsbourg, vocês sabem, é o resultado daquele Tale of Two Cities pós-dickensiano - Serge Gainsbourg e Jane Birkin, então...



Video by Jean-Baptiste Mondino


domingo, 7 de dezembro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Fauna Abyssalis, Extended Version



Egresso de algum naufrágio, trouxeram
de volta à praia um homem - quase afogado.
De uma quase morte para esta semivida.
Silêncio em volta dele, qual muralha
líquida. O riso dos salvadores, nervoso,
cheio de farpas, na tarde clara.
Por causa do ex-náufrago, afastou-se
o fantasma do tédio. Pescadores de homens,
cada um tem hoje uma história
para contar em casa - onde são heróis.
O recém-salvo salvou seu dia. E agradece.
Embora só consiga olhar detidamente,
perdidamente, o mar. Embora só tenha
ouvidos para o que lhe diz a garganta
imensa, devoradora de navios. Embora
tenha o corpo marcado pelas infinitas
vagas que esculpiram seu destino.
Na imemorial espuma do deus,
na garganta multiforme do deus,
ficou sua alma aprisionada, transmutada
em lâmina, em gema, em cristais que
cantam, toda vez que ele lembra.

Words by Livia Soares

Image : Painting by Du Xinjian (somewhat modified)


Frase do Mês




"ALWAYS BE A POET, EVEN IN PROSE"

CHARLES BAUDELAIRE

Photo by Maysa de Albuquerque


terça-feira, 18 de novembro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": La Dame Est Bien Dans Sa Peau



Não sei que rumor é esse. E sei muito bem.
É como se um caderno antigo se deixasse folhear pelo vento.
É o ruflar das asas do desejo indo ao encontro da memória,
essa distração que me mantém viva. "Olha", disseste,
"está acontecendo outra vez", disseste ainda, num tom
de invocação e foi o quanto bastou. Nossos poderes
se espreguiçam sob a relva, os plátanos parecem
feitos de âmbar e mel silvestre. Como tudo se renova,
bafejado pelos séculos! De perto, a gente pode vê-las
perdendo as folhas, o tronco se descama - tua voz
recriando a realidade, tua boca exalando as sílabas
farfalhantes, a tarde inédita, de repente. Uma lufada
de vento frio demais para uma dama - ou duas. Longe,
tão longe a idade das palavras vãs - mas ninguém te preveniu
sobre a embriaguez do orvalho? Ficamos importantes demais,
era fatal que empalidecêssemos, nós, os últimos reflexos
do rubi no fundo da taça, a cena em sépia que ameaça
eternizar-se. Talvez tenhas dito "amor" alguma vez.
"Rumor" foi a palavra que escolhemos, a voz entrecortada,
os lábios entreabertos, as palavras se partindo em
meio às folhas, perfumes que não soubemos nomear.
No lugar do teu nome, o silêncio voltando a ser
apenas um halo de luz roubada do nosso esplendor.
E sopraste:"É só mais uma estação que se inicia".
Eu não duvido, meu amor, meu doce delírio,
faz de conta que os anos não passaram. Os anos desfolharam
e as páginas dos caderno são mais belas assim, amareladas.


Words By Lívia Soares
Photo by Maysa de Albuquerque


Frase do Mês (pela passagem do Dia dos Mortos)




"ESTE MUNDO É INCONCLUSO; ALÉM,
HÁ CONTINUAÇÃO, INVISÍVEL COMO A MÚSICA,
EVIDENTE COMO O SOM"

EMILY DICKINSON

Video: "Clothes of Sand", a song by Nick Drake
with some irish graves by Offpix



sábado, 25 de outubro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": O Mundo Sem Elas



Falemos de nossos blogs, falemos sempre.
Há metafísica bastante num blog. Garrafa
ao mar, cada uma em sua ilha de edição,
cada qual mais ocupada em fabricar
o duplo angélico de si mesma: quanta sutileza
nos jogos de luz e sombra... em que pensava ela
ao escolher tal ângulo? Que feliz escolha
de palavras e silêncios...em que pensava ela
ao escrever tal verso? E assim seguimos,
passando ao largo de nossos mares, os minutos
breves demais para conter as ilhas na corrente,
os dias retesando (em vão?) o arco da promessa -
e o paradoxo que nos faz mais belas.


Words by Lívia Soares
Photo by Victor López Ruiz (slightly modified)

Frase do Mês





"'AND WHAT IS THE USE OF A BOOK', THOUGHT ALICE,
'WITHOUT PICTURES OR CONVERSATIONS?'"

LEWIS CARROLL: ALICE IN WONDERLAND

Vídeo: "Alice Remix" by Faggottron



domingo, 21 de setembro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Michelangelo e Seus Irmãos



O amor é um belo rapaz
com os dentes estragados.
A beleza é uma dama impassível
a quem faltam os braços.
A vitória decapitada abre
as asas num convite à viagem.
Os deuses são apenas estátuas
gastas; as musas foram descartadas;
as ninfas estão fartas. E no entanto
os frios seres de pedra e bronze
e madeira e pano e pigmento
possuem num dedo minimo
(que às vezes falta) mais humanidade
que a espécie humana (intacta).
E os mortos que moldaram esses seres
possuem uma Voz que ainda se eleva
e a musculatura exata das estátuas
rumoreja; e as fontes imemoriais projetam
seus gêiseres; e os vitrais mastigam
lentamente a luz do sol, dizendo
frases que ficam pairando no ar
das alturas. E la nave va, apesar
de tudo, a Terra se move,
com os vermes roendo seu cerne,
com mortos grandes demais para
tentar salvá-la: o comando à deriva,
os passageiros de olhos vendados,
enquanto as ruínas falam mais alto.


Words by Lívia Soares
Image: Photo by Tim Walker


sábado, 20 de setembro de 2008

Da Série "Glimpses of Nirvana": WISE UP (1999)


Aimee Mann, pretty woman in male garment, destilando sabedoria numa pop song impecável.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Avec Tout Mon Enchantment Pour Les Humanoids



Naquele dia, o mar inundou de sal os bosques.
Uma sereia ficou presa pelos cabelos.
Semanas depois, quando o mar arrefeceu,
dizia-se, a sereia ainda vivia. Com sua vida
inventada, seus cabelos esverdeados,
com a respiração nutrida pelas almas
de mil árvores mortas, a sereia ainda vivia.
No limbo subaquático que já fora um bosque,
depois, o fundo do mar e depois,
só Deus sabe o que será, a sereia regia
um coro de vozes abafadas, semidespertas,
engasgadas com uma teia de algas levemente
apodrecidas. Esta é a canção que roubou
e tem roubado o sono da nossa aldeia.
Alguns de nós ainda compõem versos
com o que restou da insônia. Os outros
já nem se indagam mais o que é feito
do nosso antigo saber. Mas vivemos disso.


Words by Lívia Soares
Image by Maggie Taylor

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Frase do Mês



"O DESEJO NÃO É DESTE MUNDO;
É PARA PENETRAR EM OUTRO MUNDO QUE SE DESEJA"

RENÉ GIRARD

Image: Photo by Maysa de Albuquerque

Da Série "Glimpses of Nirvana": AVALANCHE (1971)


Leonard Cohen, so beautiful, so dangerous...

sábado, 30 de agosto de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Mães da Invenção



"What kind of girl do you think we are?"

FRANK ZAPPA


Duas moças nuas sobre as dunas
podem até ver estrelas de coral,
podem seguir OVNIS pelo céu...
Duas moças nuas sobre as dunas,
com algum direito a ridículo e drama,
cada uma, pedra que impede
a outra de subir à tona...mas
quem salvaria uma bruxa que se afoga?
Detalhes no desenho da nave-mãe,
grãos de areia na Engrenagem,
moças e dunas têm a cor da Lua.Mas
quem salvaria duas bruxas que se afogam?


Words by Lívia Soares
Image: Painting by Susan Jamison

Da Série "Glimpses of Nirvana": L'AMITIÉ (1965)




Françoise Hardy, The Tiny Goddess, mostrando aos mortais que a eternidade cabe numa canção de dois minutos e dezenove segundos de "duração".

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": La Vida Es Un Milagro, Por Supuesto



A vida deve continuar
como aquela luz que não se esvai
como aquele show que jamais findasse
a vida deve, sim, continuar
até se confundirem o vivido e o sonhado -
os livros apenas escritos
e a biblioteca dos sonhos:
eu poderia jurar que estavas lá -
cerrando um pouco os olhos, eu
te traria de volta; mas hoje
as estrelas estão nervosas,
mal cabem na pele da noite
imantada por páginas sem poesia;
e eu desejo apenas voltar para casa,
para minha casa às margens da alegria.


Words by Lívia Soares
Image: collage by Alexis Anne Mackenzie



sábado, 2 de agosto de 2008

Frase do Mês



"TOUTE VUE DES CHOSES QUI N'EST PAS ÉTRANGE EST FAUSSE"

PAUL VALÉRY


Photo by Maysa de Albuquerque

Da Série "Glimpses of Nirvana": I GOT YOU BABE (1973)





David Bowie e Marianne Faithfull em estado de graça: quero compartilhar este momento com vocês, queridos e queridas. Estou de volta. May God bless you all.

sábado, 19 de julho de 2008

Frase do Mês




"I HAVE BEEN TO HELL AND BACK;

AND LET ME TELL YOU, IT WAS WONDERFUL"

LOUISE BOURGEOIS
Image by Dan Hillier

quarta-feira, 23 de abril de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Sobre a Arte de Molhar os Pés


Também eu, de vez em quando, aprecio estar viva.
Ao pé do mar, apraz-me olhar de longe os sentimentos,
perguntando-me se são meus. Imaginando que
de fato me pertencem esses rastros de uma suposta
humanidade. Apraz-me constatar que o verão
não basta, que os seus restos me perseguem, fossilizados,
material de construção. Mas só pensar "isto me apraz"
já me derruba. Não era para haver uma distância?
A varanda deveria ter ancorado lá, nos dias de verão.
Era então possível vislumbrar os sentimentos ao longe,
boiando, à deriva - lambidos, desgastados, polidos
pelas ondas, engastados no verde móvel ululante,
pequenas jóias. Por obra e graça dos ventos,
esse tesouro ia então crestando ao sol, dourando
a espuma fria, servindo à vezes de pasto às fêmeas
de tubarão. Seu bem mais precioso era a chave
de um antigo poder - arrastar-me de novo às profundezas.
Lá, naquele abismo submarino, teu ossário resplandecia,
trêmulo de algas, sussurrando, à minha espera. Como antes.
Mas então me faltou o ar - defeito de fabricação -
e voltei mais cedo. Ou tarde demais. Agora me falta
o mar. Os sentimentos me machucam os pés
na areia dourada, olham-me de longe os restos de
um naufrágio. É hora de trabalhar. Apraz-me, serenamente,
esse ofício que um dia me escolheu.
Words by Lívia Soares
Painting by David Inshaw

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": O Fracasso da Linguagem






"...on this glorious occasion of splendid defeat..."

ANTHONY NEWLEY



"Eu te amo"

é uma concha vazia

onde ecoam mentiras primevas.


"Eu te amo"

é um possível mantra

de retorno à origem do fogo.


"Eu te amo"

é inversamente proporcional

à tua ânsia de amar.
Words by Lívia Soares
Photo by José Boldt


sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Penelope Reloaded, Embracing The Breeze






Abraçando a brisa com suas lágrimas,

límpida, junto ao mar, ela espera.

E o que espera ela? Que o grande céu líquido

se mova, constelações dispostas ao presságio,

ante suas retinas que inteiras se molham?

Que o doce hálito da miragem, desde

a fímbria do Ocidente, venha a sussurrar:

"Está vindo, está vindo...", é o que ela espera?

Cerrando os olhos, talvez possa ler

os sinais salgados na própria face:

haverá, no sopro oceânico, mensagem?

Esse perfil se esfumando ao longe

é o fruto do trabalho dos seus dias.

Tudo que ela sabe está aqui, condensado

no instante: interrogar os deuses, o Deus,

perder-se. Para que se cumpra o milagre.

Na sua tapeçaria de algas, uma linha prateada

se desmancha no ponto exato

onde o céu se liquefaz:

os nautas lhe chamam "horizonte".





Words by Lívia Soares
Photo by Patrick Jablonsky

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

Dos "Cadernos de Poesia": Mary Magdalene's Sister


Vês? Eu tenho um tesouro guardado

ali, entre as róseas colunas do Templo

eu venho guardando um tesouro

ali, onde o pecado opera seus Milagres

eu guardo uma caixa de palavras

ali, na garganta aberta da Sereia

eu guardo palimpsestos e códices

ali, onde a Carne é mais viva

eu guardo uma arca de mitos

ali, onde a era de Peixes reverbera

eu guardo uma armadura e um juramento

ali, no secreto centro da Rosa

eu guardo preces mudas de outro tempo

ali, onde os teus Pés finalmente pousam

guardei este vinho, que brota só porque vieste.





Words by Lívia Soares
Painting by Susan Jamison

Frase do Mês


"Os mistérios do amor na alma vicejam;

mas são lidos no corpo, o seu volume."


JOHN DONNE

(1572-1631)
Photo by Julia Margaret Cameron

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

Eu Tenho Um Blog de Elite



Agradeço ao amigo Carlos Henrique Guanabara Leiros, do Almofariz (http://almofariz-nob.blogspot.com/), que teve a delicadeza de me conceder este prêmio. E, já que uma das minhas resoluções de Ano Novo é acabar de vez com a falsa modéstia, vou logo dizendo: se ele, leitor criterioso que é, me achou merecedora desse prêmio, por que hei de discordar? Eu devo estar merecendo, mesmo. Além disso, creio que o espírito dessas premiações é muito saudável: ajuda a ampliar o espaço virtual das nossas relações lítero-afetivas. Acreditem, conhecer mais um punhado de blogs bacanas faz um bem enorme. Que venham novos leitores e amigos; e que os atuais tenham cada vez mais motivos para nos visitar.
Bem, agora vamos à árdua tarefa de escolher, em meio a tantos que admiro, os meus indicados para receber a comenda "Eu Tenho Um Blog de Elite". São eles:

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

Feliz Ano Novo


Queridos amigos, queridas amigas:

perdoem-me o longo silêncio. É que fui engolfada e revolvida por uma gigantesca onda de emoções de fim-de-ano; e, para completar, recebi a improvável visita do Anjo, como diria São Rilke no seu livro de horas. Fiquei sem palavras. Mas agradeço aos que me visitaram nesse intervalo. Responderei individualmente a todos em suas casas e voltarei a postar em breve, tão logo meu cérebro recupere o uso de suas faculdades racionais. Desejo a todos(as) um excelente ano de 2008, esperando desfrutar sua adorável companhia por muito tempo ainda...

Um abraço.