O amor é um belo rapaz
com os dentes estragados.
A beleza é uma dama impassível
a quem faltam os braços.
A vitória decapitada abre
as asas num convite à viagem.
Os deuses são apenas estátuas
gastas; as musas foram descartadas;
as ninfas estão fartas. E no entanto
os frios seres de pedra e bronze
e madeira e pano e pigmento
possuem num dedo minimo
(que às vezes falta) mais humanidade
que a espécie humana (intacta).
E os mortos que moldaram esses seres
possuem uma Voz que ainda se eleva
e a musculatura exata das estátuas
rumoreja; e as fontes imemoriais projetam
seus gêiseres; e os vitrais mastigam
lentamente a luz do sol, dizendo
frases que ficam pairando no ar
das alturas. E la nave va, apesar
de tudo, a Terra se move,
com os vermes roendo seu cerne,
com mortos grandes demais para
tentar salvá-la: o comando à deriva,
os passageiros de olhos vendados,
enquanto as ruínas falam mais alto.
Words by Lívia Soares
Image: Photo by Tim Walker