quinta-feira, 23 de agosto de 2007

In the Beginning...



Agora há pouco, ao dar meus primeiros e incertos passos neste blog, lembrei, de repente, que hoje é o aniversário da minha mãe. Se estivesse entre nós, estaria completando setenta e quatro anos. Não pude deixar de sentir um arrepio na aura. A fotografia de Julia Margaret Cameron, o verso de Safo, o título de um filme de Alfred Hitchcock (A Dama Oculta), rodopiavam há alguns dias entre os meus pensamentos. Foram-se fundindo aos poucos, entre uma conversa e outra com meu amigo Carlos Henrique. Ele vivia me instigando a fazer um blog. Eu relutava. Mania de postergar a felicidade? Mas quem disse que vou ser feliz aqui? Minhas mãos estão geladas e trêmulas. Mesmo por trás da máscara virtual, sinto-me ruborizar até a raiz dos cabelos. E Carlos botando pilha: "Anda com isso, quero ver seus poemas na internet, quero vê-los publicados, quero que o mundo os veja. Vamos fazer logo esse blog, ainda hoje." Quando olhei para os adereços da minha própria máscara virtual, fiquei momentaneamente desconcertada. Gostei, achei que me traduzia, mas não sabia o porquê. Arrisco uma explicação: a criancinha adormecida, velada pela sombra materna, funciona para mim como uma metáfora daquilo que em nós desmaia, de pura exaustão, depois de muito brincar (tentativa e erro). O feminino absorto que nos observa enquanto dormimos: essa seria uma das formas que uma dama pode assumir para se ocultar. Receio que essa criança seja eu, em mais de um sentido. Receio que essa mulher seja eu, em mais de um sentido. Suponho que as mães não morram nunca, mesmo depois que até as suas feições já se tornaram imprecisas em nossa lembrança. A mãe é o primeiro enigma, a primeira lição de amor, a primeira grande perda, a porta através da qual somos expulsos do paraíso (amniótico) para o mundo... Mas como me queixar? Pois no mundo, entre outras coisas, encontraremos aqueles e aquelas que estamos destinados a amar. Para isso vim. Para melhorar a qualidade dos meus encontros até que se tornem poéticos. Para melhorar meus poemas até que eles se tornem subitamente belos - com toda a força misteriosa dos começos.


Palavras de pórtico por Lívia Soares

Imagem p&b: Julia Margaret Cameron
Imagem colorida: anônimo

2 comentários:

Carlos Henrique Leiros disse...

Ah...se eu tivesse um desenho daquele bonequinho fazendo reverência...ia colocá-lo aqui, certamente.
O texto ficou belo, Lívia, como era de se esperar. Suas reações de alegria e emoção ficaram como que impregnadas, fazendo-nos imaginar em cada pensamento desenvolvido uma miríade de imagens e idéias.
A Dama Oculta faz sua estréia divinamente.
Fico bastante feliz por você, pela chegada de tão belo espaço. E vamos aos poemas..."quero que o mundo os veja"!
Abraços do
Carlos

Sonja disse...

Querida,
Finalmente encontro A Dama Oculta que se revela em poesia, mistérios, emoções, tentativas, erros e acertos.
Seus textos e poemas saõ belos e profundos, um respirar para almas em chamas.
Um beijo de admiração e carinho,
Sonja